A Câmara dos Deputados aprovou a regulamentação do mercado de apostas on-line no Brasil na noite de quinta-feira, e incluiu novamente os jogos ou cassinos on-line no texto. Essa modalidade compreende desde games como o Fortune Tiger, popularmente conhecido como Jogo do Tigrinho, até bingos virtuais. Para especialistas, a mudança cria uma incongruência, porque jogos de azar em estabelecimentos físicos continuam ilegais no Brasil.

A inclusão desse tipo de jogo no projeto foi criticada nas discussões na Câmara durante a votação por parlamentares críticos à proposta.

— O artigo 3º diz que as apostas de cotas fixas de que trata a lei poderão ter por objeto eventos virtuais de jogos. O que é isso? É a autorização do famoso Jogo do Tigrinho, é o Jogo do Aviãozinho que está sendo legalizado — afirmou Professor Paulo Fernando (Republicanos-DF).

O relator do projeto, deputado Adolfo Viana (PSDB-BA), defendeu os termos do texto:

— Não estamos aqui discutindo se queremos ou não ter jogos on-line em todo o território nacional. Essa é uma realidade, e não podemos varrê-la para debaixo do tapete.

Para Caio de Souza Loureiro, sócio da área de Gaming & E-sports do TozziniFreire Advogados, como as plataformas e a forma de utilização dos jogos on-line e das apostas esportivas são parecidas, faz sentido que os mesmos mecanismos de controle sejam aplicados:

— Não é incongruente liberar os jogos on-line e não os presenciais, porque a mecânica de operação entre eles é muito diferente. Os jogos presenciais precisam de controles e regras adequadas a suas especificidades. Os jogos on-line compartilham mais semelhanças com as apostas esportivas do que com jogos presenciais — opina.

Direito para o consumidor

O professor de Direito da FGV Daniel Dias discorda: se a atividade não pode funcionar fora da internet, não deveria ser permitida on-line. Ele aponta que a falta de transparência nos algoritmos de jogos de azar on-line contradiz o princípio de transparência do Código de Defesa do Consumidor. Não é possível saber se a combinação no Jogo do Tigrinho, por exemplo, é realmente aleatória.

Regulamentar, no entanto, continua sendo a melhor alternativa para os especialistas, sobretudo porque a nova legislação define regras para proteger o consumidor e exige que as empresas tenham representação brasileira.

Os apostadores que não conseguirem sacar seus ganhos em uma plataforma de bets, por exemplo, podem acionar o Procon ou protocolar ação judicial. Muitos consumidores se queixam de não conseguir hoje retirar a quantia que ganham jogando:

— Quando trago o mínimo de direito para o jogo, facilito a vida do vulnerável, do consumidor. Nosso Direito do Consumidor é rigoroso com o fornecedor de serviços.

Magno José, presidente do Instituto do Jogo Legal (IJL), defende que os demais jogos de azar, mesmo em estabelecimentos presenciais, sejam descriminalizados:

— O Brasil é o maior mercado do mundo de jogos não regulamentados. Tem cassino, bingo, jogo do bicho, movimentando entre R$ 25 bilhões a R$ 28 bilhões por ano. O Brasil não pode mais ficar oitenta anos com jogo clandestino.

Loques afirma que usualmente a Justiça brasileira responsabiliza os fornecedores no caso do consumidor ter algum problema com o produto ou serviço. As celebridades que estrelavam campanhas de publicidade antigamente, portanto, não eram responsabilizadas. Mas agora existe um formato novo, com o influenciador, alguém que mistura a vida com a propaganda:

— E o influenciador ganha pela quantidade de apostadores que atrai e pela quantidade de dinheiro que traz para a casa. Como ele age em proveito próprio, deveria ser responsabilizado. Mas ainda não há jurisprudência clara sobre isso.

O advogado especialista em Direito do Consumidor Ricardo Morishita afirma que, se o projeto de lei for sancionado, deixa de haver prática ou publicidade abusiva. Mas afirma que, a menos que haja alguma disposição expressa, a responsabilidade solidária continua.

Com informações do jornal O Globo